Vamos imaginar que depois de ler alguns artigos sobre corrida, você decide que é hora de começar a correr. Você compra um tênis, localiza no mapa o parque mais próximo e veste uma roupa apropriada para o exercício. Você está animado, mas quando chega ao parque vê outras pessoas correndo confiantes e que, com total naturalidade, conseguem manter um ritmo em suas passadas — que você duvida alcançar. Começa a se sentir desconfortável, o batimento cardíaco acelera, as pernas já amolecem, as mãos ficam suadas e só vem a seguinte frase na cabeça: “de onde eu tirei a ideia de que poderia fazer isso?”
Esse sentimento de instabilidade faz com que você queira se virar e voltar correndo — ironicamente — para casa, onde pode escapar do julgamento de outras pessoas e do seu próprio medo do desconhecido. Eu te entendo, já passei por isso nas mais diversas circunstâncias pessoais e profissionais.
O que eu tenho aprendido ao longo da minha carreira é que essa insegurança está presente em todos nós, e é tão forte que muitas vezes nos esforçamos para evitar situações que podem nos fazer sentir frágeis, e por conta disso, todas as manhãs antes de começar mais um dia trabalho, nos vestimos de uma armadura anti-emocional para não sermos vencidos pela vergonha, incerteza, ansiedade e medo (que dirá em tempos de uma pandemia global, não é mesmo?).
A armadura anti-emocional pode mudar de pessoa para pessoa, mas particularmente identifiquei que a usava por algum desses três motivos: exigir a perfeição, auto-sabotagem ou considerando apenas o viés de como aquela situação poderia dar errado. Soou familiar?
Confesso que ainda faz pouco tempo desde que comecei a aprender que está tudo bem não estar preparada para as coisas que nunca fiz antes, está tudo bem não saber todas as respostas, está tudo bem me estressar, está tudo bem falhar alguma vezes na liderança, está tudo bem “perder a mão” à frente dos negócios, está tudo bem não performar 100% todos os meses.
Ah, calma… você tá achando que este artigo é sobre o conformismo com o fracasso?
Redondamente enganado. Este artigo é justamente para te contar sobre outra perspectiva: distraidamente, dia desses no ano passado, navegando entre alguns TED Talks, conheci a Brené Brown e o seu arrebatador discurso sobre o poder da vulnerabilidade. Ao fim do TED, motivada pela curiosidade de saber de onde essa recém-conhecida havia conseguido construir um discurso tão motivador a partir de sentimentos tão opostos. Adivinha? Descobri que a Brené é pesquisadora na Universidade de Houston, e dedicou toda sua carreira aos estudos sobre vulnerabilidade, coragem, empatia e vergonha.
Devorei Brené. Era minha única alternativa. Passei semanas consumindo os vídeos disponíveis na internet e os livros disponíveis para comprar, acreditando que ao encontrar uma base científica a favor da possibilidade dos meus fracassos, conseguiria algum conforto. No entanto, ao final desta imersão aprendi que a vulnerabilidade é a coragem na sua forma mais autêntica, a capacidade plena e genuína de me expressar de forma original e franca, de fazer coisas sem garantias e sem poder controlar o resultado algumas vezes.
Muito atual para estes tempos de não-respostas e não-certezas, de acordo? O COVID-19 formatou um cenário propício para colocar em posição de vulnerabilidade qualquer empresa, e por isso, acreditei que era o momento oportuno de resgatar alguns dos insights das publicações da Brené e trazer com uma perspectivas voltada aos negócios. Animados? Aí vamos nós:
Protagonismo sem ensaios
Sente um friozinho na barriga? Eu, você e o resto do mundo também. A atual pandemia colocou uma comunidade global de negócios e lideranças no palco sem nenhum ensaio prévio — ninguém estava preparado para as repentinas mudanças de rotina, estrutura, logística, operações, tecnologias e pessoas.
Não há como julgar quem tomou medidas drásticas cedo ou tarde demais. Todos estávamos tentando fazer alguma coisa, como sempre estivemos em outras situações mais conhecidas — e lembre-se que mesmo assim, igualmente já erramos e acertamos.
Em situações de vulnerabilidade, somente a coragem nos permite tomar decisões de alto risco, conduzir conversas difíceis e assumir papéis de alta visibilidade do que em outras experiências prévias. A autopromoção é sem dúvida desconfortável, mas em alguns casos é extremamente vital. Afinal, não se pode esperar que mais alguém fique entusiasmado com alguma coisa se você mesmo não estiver.
Quer tentar algo na carreira ou à frente da sua empresa durante a quarentena? Pense que tem 50% de chances de dar errado e 50% de chances de dar certo (e use filtro solar!). O importante de lembrar agora, que o oposto de agir é fracassar sem qualquer tentativa — e tendo o COVID-19 como a desculpa, nos caberá como forte argumento para abandonar qualquer uma das responsabilidades. No fim, as escolhas são sempre nossas e teremos que saber lidar com elas pelas nossas vidas inteirinhas (tá preparado?).
Sem vergonha, mas consciente
Sabemos o esforço que temos para construir a reputação dos nossos negócios e nossas carreiras. E por conta disso, aprendemos a esconder os desafios que não conseguimos vencer e que, no fundo, nos causam estresse contínuo há tempos. Porém, a quarentena forçada e uma mudança acelerada de nossas dinâmicas, ressaltou que o que reprimimos fosse o principal gatilho para ressaltar nossos gargalos. O resultado? Negócios faliram e pessoas foram desligadas por conta disso.
Há uma oportunidade única de assumir e reconstruir nossos pontos de conflito, reorganizar o que não funciona em nossas rotinas e operações, nos humanizar como empresas e nos reinventar como profissionais. Temos uma arena aberta e disponível de aprendizado conjunto, por isso, não vamos continuar a manter uma postura enrijecida nas verdade absolutas (aliás, a B.done nasceu para isso e estamos disponíveis para discutir e co-criar o mercado do futuro. Só me chamar!).
Lideranças fortes são lideranças vulneráveis
Diversas vezes Brené descreve a vulnerabilidade e a autenticidade como a base da conexão humana — que geralmente está ausente nos ambientes de trabalho. O motivo dessa ausência tem indícios culturais: fomos ensinados termos determinados comportamentos se estamos ocupando a cadeira de líder ou liderado, manter distância e projetar um perfil de confiança, competência e autoridade. Confessamos nossas vulnerabilidades aos nossos companheiros, amigos próximos ou nossos terapeutas em encontros fechados e ambientes “seguros”, mas nunca a demonstraríamos no trabalho.
Embora possamos tentar parecer perfeitos, fortes ou inteligentes, a fim de sermos respeitados pelos nossos líderes ou liderados, fingir geralmente tem o efeito oposto e dura muito pouco tempo. Mas se adotamos uma postura autêntica e vulnerável, nos identificamos simplesmente como “humanos” (olá, você também!), e esta é uma posição de aproximação que nos coloca não em hierarquia, mas horizontaliza nossas relações profissionais e abre espaço para disrupções e co-criações.
Resiliência para se recuperar da falha
Quando corremos o risco de sermos corajosos, assumir posições de visibilidade e tomar decisões sem garantias de sucesso, estamos abertos a levar uma desastrosa rasteira. Mas isso é uma consequência natural da coragem, e é por isso que é tão difícil e poucos são os líderes e negócios que ganharam notoriedade durante essa pandemia.
Brené compartilhou em uma de suas palestras uma citação de Theodore Roosevelt intitulada “O homem na arena”, que segunda ela, conduziu o início da sua pesquisa sobre vulnerabilidade nas últimas duas décadas:
“Não é o crítico que importa; nem aquele que aponta onde foi que o homem tropeçou ou como o autor das façanhas poderia ter feito melhor. O crédito pertence ao homem que está por inteiro na arena da vida, cujo rosto está manchado de poeira, suor e sangue; que luta bravamente; que erra, que decepciona, porque não há esforço sem erros e decepções; mas que, na verdade, se empenha em seus feitos; que conhece o entusiasmo, as grandes paixões; que se entrega a uma causa digna; que, na melhor das hipóteses, conhece no final o triunfo da grande conquista e que, na pior, se fracassar, ao menos fracassa ousando grandemente”.
Estamos de acordo que esta citação mostra o poder que há em ser vulnerável? Há o risco de se sujar, de se machucar e até mesmo perder, mas ganhar ou perder na arena é o que nos torna corajosos. E acredite, grandes líderes e empresas não querem ter ao lado aqueles que não se arriscam por nada, nunca.
Valores não são negociáveis, são construídos
Me corrija se eu estiver errada, mas não é novidade que a maioria das empresas não operacionaliza e transforma em comportamento de rotina um décimo dos valores que ela mesma adotou.
No entanto, não há dúvidas que são os valores que nos definem em níveis mais profundos — nos refletem quando somos derrubados e, ao mesmo tempo, são as molas propulsoras para voltarmos do fundo do poço. Talvez, fica muito mais fácil pensar em como a coragem e a vulnerabilidade são aplicadas à carreira e a vida pessoal, mas é igualmente aderente quando falamos sobre os negócios.
Empresas com uma cultura mais corajosa, propiciam um ambiente de embate para discussões valorosas, criam estratégias disruptivas e dão espaço para seus profissionais assumirem mais riscos nas suas posições. Em tese, significa que empresas corajosas desenvolvem uma cultura de confiança e respeito entre as pessoas, fomentam o aprendizado contínuo com as falhas, aprendem mais rápido e, de sobra, constroem um ambiente para atrair e reter os melhores e mais audaciosos talentos.
O mais curioso de todo cenário causado pela pandemia global que passamos, é o fato de ela ter um único efeito nas mais diversas culturas ao redor do mundo: a certeza de que não há nada que esteja isento de risco. O que quero dizer? As culturas tanto de nações, quanto de empresas, disponíveis a assumir riscos e admitir suas vulnerabilidades com o intuito de realizar mudanças disruptivas, são as mais adaptáveis e as que terão maiores chances de sobreviver pós-pandemia.
Impossível não finalizar este artigo e pensar na B.done, que nasceu em tempos de vulnerabilidade extrema, mas em contrapartida reunindo a oportunidade única de encontrar clientes, parceiros e fornecedores corajosos, que não escolheram outro lugar, senão lutar na arena e construir os negócios do futuro.
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Vamos conversar sobre como transformar a vulnerabilidade em um forte argumento para crescer nossos negócios?